quarta-feira, 25 de abril de 2007

ridiculinha, 22

oráculo:
10 + 12 = 22
08 + 12 = 20
também nas diagonais.
sempre 222...

na curva

Hoje conheci a minha casa: janelas enormes de ver a cidade em noites de lua e dias de chuva; o chão ainda vermelho que mostrará o mosaico simples; as cores das paredes que serão brancas e limpas; o vazio que acolherá generoso a mesa velha, os livros e o tumulto; o vento que assistirá contemporâneo a cada um dos nossos atos de amor.

Ali envelheceremos suaves e bonitos como as curvas do arquiteto, desenhando com ensolarado e sombra a tristeza e a felicidade.

O número sobre o batente é alvissareiro.

Meus sonhos já estão fazendo a mudança.

terça-feira, 24 de abril de 2007

carta escarlate

Então tu me tomarias nas mãos masculinas e me devorarias bruto e sem qualquer poesia como se diante de uma prostitutazinha inominada. Em nossa cama quererias outras mulheres e outros homens de rostos púberes para assistirem ao espetáculo. Meu corpo humilhado, meu sangue caindo entre as pernas quase bonitas, meu grito surdo, minhas mãos suplicantes, teus olhos autistas e teu prazer de estivador. Dormirias consecutivo o sono dos justos enquanto eu, continente emproada, recolheria os cacos cheirosos da minha menarca desfiados no chão de madeira velha.

segunda-feira, 23 de abril de 2007

padroeiro

Agora posso olhar em volta: meu entorno, bagunçado ainda, faz de novo sentido, e meu horizonte, que antes tinha o tamanho dos meus pés, hoje se abre na doçura das possibilidades.
Mas é preciso arrumar as contas, fazer mercado, pagar dívidas, comprar flores. Não posso perder a vigilância - eu que sou feita só de amor careço dos algorítimos para não deixar o mundo real me engolir, e de coragem pra não perder o brilho dos olhos.
Por isso, São Jorge, peço humílima, fica comigo, não me abandones, empresta-me a tua bravura, dá-me a bênção da tua proteção:
"Deus me perdôe essa intimidade
Jorge me guarde no coração
Que a malvadeza desse mundo é grande em extensão
E muita vez tem ar de anjo e garras de dragão".
(moacyr luz, aldir blanc; medalha de são jorge)

sexta-feira, 20 de abril de 2007

ridiculinha, 17

na travessia também é o verbo:
tempo: futuro do presente
modo: imperativo
complemento: trans-transitivo
significado: o mesmo, o outro.

quarta-feira, 18 de abril de 2007

ridiculinha, 16

o verbo:
se Deus escreve, há de ser em português;
certamente Ele consulta o Houaiss.

rosa-louca

Acepções
substantivo feminino
Rubrica: angiospermas.
arbusto (Hibiscus mutabilis) da fam. das malváceas, nativo da Ásia tropical, de folhas ásperas e flores brancas pela manhã, vermelhas ao meio-dia e róseas à tarde
Sinônimos
amor-dos-homens, aurora, mimo-de-vênus, papoula, papoula-de-duas-cores, rosa-branca, rosa-de-são-francisco, rosa-paulista.

(fonte: dicionário houaiss da língua portuguesa)

terça-feira, 17 de abril de 2007

rosas na rua

o canteirinho mais bonito da avenida que leva às bordas da cidade (que agora vai ficando pelada e cheia de vergonha...) é um rosal: miniaturas de beijos, branquinhas, vermelhinhas, rosinhas, espalhadas, gentis e nada tímidas sob o sol da manhã ordinária. Ninguém presta atenção nelas, os carros e as pessoas passam rápidos e se esquecem de espiar a vida. Ainda bem que meus olhos estiveram lá para vê-las e inventar-lhes o perfume, fazendo crescer no meio do peito a certeza de que tudo então vai dar certo.

ridiculinha, 117

ar-revoada:
tecer a vida com orvalhada e aleluia
encarnada no dia, lumeeira na escuridão
não haverá mais solidão.

das origens da rosa

Datação
sXIII cf. FichIVPM
Acepções
substantivo feminino
1 a flor da roseira
2 Rubrica: angiospermas.
design. comum aos arbustos do gên. Rosa, da fam. das rosáceas, que reúne cerca de 150 spp., por vezes escandentes, ger. com espinhos e flores solitárias ou em panículas, e aquênios em receptáculos carnosos [Nativas de regiões temperadas do hemisfério norte e de áreas tropicais montanhosas, são mundialmente cultivadas, com milhares de híbridos e variedades, como ornamentais e para o comércio de flores, para extração de óleos essenciais us. em perfumes, por propriedades medicinais etc.]
3 Rubrica: angiospermas.
m.q. roseira
4 m.q. 1rosácea ('estrutura como a da rosa desabrochada', geom, mús)
5 (sXIII)
mancha circular e rosada em cada uma das faces
6 Derivação: por extensão de sentido.
mancha rosada no corpo, ger. provocada por picada de inseto
7 Rubrica: encadernação.
peça de latão, ornada de lavores, que serve para dourar os livros
8 Rubrica: heráldica.
representação da rosa dos jardins, com pé e folhas
9 Rubrica: música.
abertura circular no tampo dos instrumentos de cordas dedilháveis; rosácea, roseta
10 Derivação: sentido figurado.
mulher bela, formosa
11 Regionalismo: Minas Gerais. Uso: tabuísmo.
o ânus
substantivo masculino
12 cor vermelho-esmaecida, à semelhança da flor de algumas roseiras; cor-de-rosa
Ex.: o verde e o r. simbolizam a escola de samba Mangueira
substantivo feminino plural
13 estado de satisfação do corpo e/ou do espírito; acontecimentos felizes; bem-aventurança, dita, ventura
Ex.: nem tudo são r.
adjetivo de dois gêneros e dois números
14 que tem essa cor; cor-de-rosa
Ex.: sapatos rosa
15 diz-se dessa cor
Ex.: a cor r. da aurora espraiava ternura pelo ambiente

Locuções
r. de ouro
Rubrica: religião.
objeto de ouro e com formato da flor da roseira, benzido pelo papa e presenteado a uma princesa católica a quem se deseja honrar
de r.
diz-se de tempo, céu, mar tranqüilo, sereno, sem nuvens ou vento (tb. us. no pl.)

Etimologia
lat. r
òsa,ae 'rosa'; acp. angios, pelo lat.cien. gên. Rosa (1735); ver ros(i)-; f.hist. sXIII rosa, sXIV rrosa, sXV rossa, sXV roza 'flor', sXIII rosa, sXIV rrosa 'cor'

(fonte: dicionário houaiss da língua portuguesa)

segunda-feira, 16 de abril de 2007

pacto

Na troca de alianças, tuas patas tomam minhas mãos pequenas.
Juramos então em todos os verbos, infinitivos e transitivados-justos e juntos para nosso amor:
amar-te, respeitar-te, olhar-te, reinventar-te, reconstruir-te, comer-te, espiar-te, despir-te, proteger-te, guardar-te, ensolarar-te, anoitecer-te, presentear-te, perder-te, descobrir-te, envaidecer-te, salvar-te, ouvir-te, escrever-te, tatuar-te, apanhar-te, colecionar-te, afagar-te, acolher-te, revelar-te, eternizar-te.
Rosa e Jorge já esperam, ali ó, na estrela mais próxima do dia.
Pois que o pra-sempre já começou, depois do início e antes do fim.

terça-feira, 10 de abril de 2007

das origens do ridículo

predomínio do sentido interior
"Era eu um poeta estimulado pela filosofia e não um filósofo com faculdades poéticas. Gostava de admirar a beleza das coisas, descobrir no imperceptível, através do diminuto, a alma poética do universo.

"A poesia da terra nunca morre. Podemos dizer que as eras passadas foram mais poéticas, mas não podemos dizer (...)
"A poesia encontra-se em todas as coisas - na terra e no mar, no lago e na margem do rio. Encontra-se também na cidade - não o neguemos - é evidente para mim, aqui, enquanto estou sentado, há poesia nesta mesa, neste papel, neste tinteiro; há poesia no barulho dos carros nas ruas, em cada movimento diminuto, comum, ridículo, de um operário, que do outro lado da rua está pintando a tabuleta de um açougue.
"Meu senso íntimo predomina de tal maneira sobre meus cinco sentidos que vejo coisas nesta vida - acredito-o - de modo diferente de outros homens. Há para mim - havia - um tesouro de significado numa coisa tão ridícula como uma chave, um prego na parede, os bigodes de um gato. Há para mim uma plenitude de sugestão espiritual em uma galinha com seus pintinhos, atravessando a rua, com ar pomposo. Há para mim um significado mais profundo do que as lágrimas humanas no aroma do sândalo, nas velhas latas num monturo, numa caixa de fósforos caída na sarjeta, em dois papéis sujos que, num dia de ventania, rolarão e se perseguirão rua abaixo. É que a poesia é espanto, admiração, como de um ser tombado dos céus, a tomar plena consciência de sua queda, atônito diante das coisas. Como de alguém que conhecesse a alma das coisas, e lutasse para recordar esse conhecimento, lembrando-se de que não era assim que as conhecia, não sob aquelas formas e aquelas condições, mas de nada mais se recordando."
(Fernando Pessoa, 1910)

segunda-feira, 9 de abril de 2007

vãos

Se eu perdesse a pena, assim como que por desgraça repentina, o certo é que nada me faltaria. Mesmo se eu perdesse o discurso todo e as palavras que me confortam e que me constituem, nada não me faria falta. Fossem embora de mim as preposições e as subordinadas, até mesmo os imperativos que a mim me servem nos cantos do desespero, talvez eu nem percebesse. E se passassem por entre meus dedos a sintaxe, os acentos, os apostos e os gramemas, nem sequer haveria despedida.
Hoje sou corpo feito de carne e afeto, carinho e violência.
Aquilo com o que fui forjada exala pelos poros e buracos, soa em meus dentes que esquecem as consoantes, pronuncia nos lábios vogais plenas, vibra nos ossos dos meus ouvidos, acende as cores dos meus olhos, ocupa a sala das minhas narinas, escorre quente por entre as minhas pernas e fecunda o chão dos meus novos dias.
Um tempo de beleza, amor acima de tudo, apesar da contra-mão do mundo.

quinta-feira, 5 de abril de 2007

amuleta

Quando finalmente arrisquei caminhar com meus próprios pés, a memória do corpo assustado com a boa-nova passou-me a perna: precisei de outros, postiços, e de paciência, tudo em câmera-lenta e esforço taquicárdico.
E quase virgens no passo sozinho, meus pés pequenos então reaprendem o andar; necessito do umbigo erguido no tempo, e descubro o real do meu peso, da minha inércia, da minha altura e da minha espessura, os limites do meu contorno agora multidirecional que corta o ar que me abraça e arrepia a pele.
Fui engendrada no amor e conheço os andaimes da dor.
O que me sustenta dentro do escuro e do medo é esse novo gosto, desconhecido e confortável, orvalhado ardido-fresco dentro da minha boca: quando não é preciso mais ser em segredo, posso sair ao sol com meu sorriso sanguíneo e meus olhos imensos em riste, o ex-voto de pétalas de rosa pendurado no pescoço e avançado no decote, desvelando meu coração vermelho.

quarta-feira, 4 de abril de 2007

coxa

Nos dias claudicantes aproveito pra maternar: luiza nas manhãs de sol com biscoito, cosquinha, rá-tim-bum e risada, joão nas tardes calorentas de tempo solto e palavras no vento, as noites de ternura e vinho e unhas vermelhas. Meu corpo sabe a hora do descanso preciso, então finge quebrar-se. A perna esquenta dentro do gesso, o resto fica de fora para o afago molhado, e a alma refresca no meio do mundo, e cada instante compartilhado vai construindo o bonito devir.
Hoje não preciso mais servir às gavetas: elas é que serão moldadas (como as pernas postiças e as cadeiras de madeira do casal de arquitetos pra-sempre sorridentes), uma a uma, pra cada um dos meus - dos nossos - sonhos.

segunda-feira, 2 de abril de 2007

condomínio

"Prezados Condôminos:
"Chegou ao conhecimento da administração do nosso Condomínio, através de reclamação feita por morador, que pessoas(s) inescrupulosa(s) e desprovida(s) de qualquer senso de convivência em comunidade, respeito ao próximo e civilidade, estaria(m) jogando pela janela do edifício PRESERVATIVOS USADOS, vindo estes a caírem na cobertura da área de serviço do apartamento 03, na copa da árvore e calçada em frente à entrada de número 976 do condomínio.
"Por tratar-se de atitude deplorável e repugnante, que não se coaduna com a conduta exigida para a convivência em condomínio, solicitamos ao(s) autor(es) de infeliz proeza, que abstenha(m)-se de jogar pela janela de sua unidade os preservativos de que fizer(em) uso, dando destinação apropriada ao referido apetrecho, pois estaremos redobrando nossa vigilância com o propósito de descobrir e punir na forma estabelecida no Regulamento Interno do Condomínio o autor(es) de inominada ação.
"Atenciosamente, Síndica"
(São Paulo, 20 de março de 2007)