quinta-feira, 12 de novembro de 2020

cartografia 39

Do chão não passa.

Tem a terra debaixo do pé. A canoa mole sobre o rio duro tem casco e paineiro, pra firmar. No mar pode não parecer, mas depois de toda água, sal e escuridão, tem o rés da areia ao fim do pouso lento. Até o poço mais sem fundo tem – um – fundo.

A dança imantada entre a gravidade e o umbigo encontra na superfície espelho, contorno e porto. Pássaros, aviões e foguetes têm na certeza do fim o impulso pro começo. As células que nascem siamesas permanecem irmãs mesmo depois de se repartirem milhares e milhares de vezes.

Pois que o chão do meu corpo está frouxo. 

Não tenho o onde cair. E não há de onde levantar voo. Todos os pesadelos irrompem como se a tampa dos meus infernos tivesse sido arrombada. Um corpo distensionado sem voz espatifado no ar. Entre-ser esgarçado de memória, genética e pavor. Areia movediça. Os destroços espalhados por aí.

Sem chão não passa.