terça-feira, 28 de maio de 2019

cartografia 7

Eu não sei jogar xadrez, e isso diz muito sobre mim. Invejo planejamentos, a tática de movimentos sobrepostos, o vislumbre das probabilidades resultantes de variáveis possíveis, o depois do depois enxergado no antes do antes.

Minha vida sempre foi de roldão: ofícios, filhos, amores, dinheiros, desamores. Sou feita de sustos, imperativos e intuições, movimentos reflexos. A malabarista dos pratinhos que giram desordenados sobre as varetas finas que às vezes vão despencando, um a um, traidores e ardilosos, e apesar do cataclisma iminente, a moça mantém o riso no rosto, mesmo com as dores nos ossos, o peito moído, os olhos transbordados, e num tcharam desajeitado põe tudo pra rodar de novo.

45 anos mais ou menos desse jeito, teimosa e valente, sem desistir.

Maio de 2019, Corpo em Risco: 35 pessoas-formosura de tudo quanto é jeito, 6 encontros, 30 horas pra construir coletivamente um espetáculo de 30 minutos, acompanhado de música ao vivo, e eu, além de dançar, responsável por compor a trilha cantando ao lado de 3 músicos imensos. Tudo conduzido por um homem incrível (sim, há homens incríveis), que tem me ensinado, talvez sem ele mesmo saber, o contorno que meu corpo pode ter, pra minha alma res/existir do tamanho que ela tem.

Ói a Juliana no olho do furacão, de novo: quem disse que eu sei improvisar? e se eu não tiver nenhuma ideia no meio do tudo ao mesmo tempo agora, e se me vier um silêncio de encarnações? e se-se-se? Eu ali, toda apertada em leggins e tops de ginástica que eu detesto, desconfortável, com medo, exposta, pelada, encolhida. Eita.

Pois que as varetas permaneceram girando no ar... eu malabarista vermelha. Fizemos, bem juntos, um troço muito, muito lindo. Foi um dia-mante, e eu não vou ter nunca como agradecer.

Fiquei envergonhada de dançar - atrapalhada, pesada, dura... Mas ao mesmo tempo senti a plenitude da certeza de saber que a música mora dentro de mim, inteiriça – meu corpo a serviço, como tem de ser. Pois que eu vivo pelos encontros verdadeiros, que me mostram, com sua gentileza, que generosidade, entrega e alegria são a cola mais potente pra juntar, como ouro, os nossos pedaços.

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