sexta-feira, 9 de junho de 2017

carta para lívia

Sabe, eu demoro muito pra ouvir os discos que ganho. Porque eu preciso ouvir sentada, só ouvir e mais nada, não sei fazer outra coisa quando estou ouvindo música, acaba que vira um tormento, as pilhas que vão se acumulando na estante, e eu olhando pra elas morrendo de culpa de não saber o que tem dentro das infinitas caixinhas e portanto correndo o risco de não ser acometida por um encontro verdadeiro, um susto inesperado de beleza, que está ali, escondido, bem na minha frente, enfim.
Mas hoje eu parei, sentei e escutei.
E que assombro que foi.
De partida, eu já ia gostar do disco porque vocês gravaram a música mais linda que há (Clube da esquina, a mesma que me fez chorar ridícula no Tupi). Depois, sua afinação é tão linda, tão linda, que dá um gosto – todas as notas, e tantas notas, e cada uma delas em seu mais perfeito lugar –, um sopro fresco e claro de alívio, vou dizer.
Mas o disco é mais que a primeira canção e é mais que sua voz impressionante (im-pres-si-o-nan-te). Ele vai abrindo nosso peito pras canções que já conhecemos, e isso é tão bonito (que eu acho um saco essa obrigação modernosa do "tem que ser só música inédita, tem que ser compositora também", como se o difícil e imenso ofício da intérprete fosse menor, e como se não houvesse tanta canção absolutamente imprescindível de se cantar e cantar e cantar de novo e de novo).
E tem esse seu moço bonito que é tão elegante e que vai junto de mãos dadas ao lado seu, que é outra coisa linda de se ver e ouvir. De novo, cada nota em seu lugar, sem mesquinharia e sem desperdício.
A música que vocês fazem (juntando aqui o disco e o show) é uma surpresa, é generosa e é livre. E se tem uma coisa que a gente precisa não perder (inda mais nesse mundo tão esquisito) é a capacidade de surpreender e ser surpreendido, e de ser veículo da música, estar na prontidão e a serviço, e deixar ela fazer o que ela quiser da gente.
Eu ouço às vezes um quase-infantil (não sei como dizer doutro modo...) no seu jeito de dizer algumas palavras, como se não desse conta do tamanho delas, como se houvesse uma distância entre a boca e a carne... será? Aparece às vezes numa nota longa, às vezes num grave, ou numa vontade de mais volume, num gesto, nos olhos fechados ou lá-longe. Eu poderia falar ainda (já pedindo desculpas pelo falatório) que eu queria ouvir no disco as guitarras mais adiante na mix, mas abraçadas à sua voz, mais perto.
Mas esqueça isso, que não tem qualquer importância.
O que fica e interessa é a formosura docês, no disco e no show. Uma coisa importantemente bonita.
Muito obrigada pelo assombro e pelo encontro. Por encharcarem meus olhos no meio da tarde. Uma sorte límpida. Que a gente não se perca mais.

Nenhum comentário: