quinta-feira, 17 de julho de 2008

carta feia

Pois que desgosto, meu senhor meu, das noites em que não estás aqui, elas que dessarte não ganham seu contorno melhor. Então, à guisa de sonífero, aproximo-te na pena do meu abraço para ver se durmo bonita, como ordenas: se estavas aqui via que o forno de ferrugem partiu-se definitivo e que precisarei de um fogão novo, o que já não era sem tempo já que este deve ter mais de três encarnações e das quatro bocas funcionavam uma e meia e o forno, embora o tampo de ágata seja do meu gosto como sabes, e não exitem mais tampos de ágata como estes, mas enfim, era velho e até que durou muito, mas não mais serve e então precisarei de um fogão novo; soletrava os nomes todos na sopa colorida com cenouras e ervilhas e letrinhas que preparei maternal para a princesa macaca e depois carregava para o dossel a bela adormecida em seu sono absoluto de justeza; respondia às perguntas desimportantemente ansiosas do meu olhos-de-floresta sobre a cidade de ar bom para onde viaja amanhã pela manhã, e por isso não consegue dormir, seus olhos imensos vão engolir o mundo um dia; e sobretudo sabia curioso da calcinha nova em mim vestida a esperar tuas patas impredicáveis. Tuas patas não estão aqui, meu senhor meu, e isso faz de mim uma mulher mais triste nesse falatório desencontrado todo. Pois perdôa-me meu senhor meu que desgosto mesmo é desse teu silêncio cinzento do mesmo modo que desgosto dessas minhas palavras aqui, feiúras que não funcionam. Esqueci como é escrever.

Nenhum comentário: