O que eu queria agora é que ela passasse por aqui pra ler aquilo em que me tornei no discurso ordenado que crio, também por causa dela. Que ela soubesse daquilo que não pude dizer nesses doze anos de vontade e resistência, mas sobretudo de afeto - um estranho diverso, como outro não vivi nem vou viver. Doze anos: nasceram os filhos, passaram homens, fantasmas, monstros, memórias, alegrias e versos de toda natureza, ela ali sentada, eu ali náufraga e nua em desmesura, desespero, descoberta, desvio, amor, e ela ali sentada, presente.
Hoje vou embora como a criança que larga devagarim a mão do pai e anda adiante no equilíbrio precário e desde então o mesmo que vai manter o umbigo longe do chão, dizendo com olhões brilhantes e frio na barriga: ó, eu posso ir sozinha.
Quero dizer-lhe que sou, embora ainda não saiba direito o que isso quer dizer. Quero que saiba que tenho quem por mim, e isso é a melhor das felicidades, bênção que mereço, flor à qual me dedico, casa e devir que construo.
Quero sobretudo que ela saiba que foi ela quem me mostrou os lápis de cor, muitos mais que os poucos que eu tinha, para que eu possa então desenhar e colorir com medo, carinho e solidão os caminhos, os redemoinhos todos.
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